Você conhece a relação entre CCS e Rentabilidade?

Um estudo das fazendas leiteiras no Brasil por Labor Rural

Com as exigências trazidas pelas legislações e pelos consumidores de produtos lácteos quanto à qualidade do leite, principalmente no que se refere à Contagem de Células Somática (CCS) e Contagem Padrão em Placas (CPP), esse assunto está cada vez mais comentado e valorizado na cadeia leiteira, levando produtores, indústrias e consultores a trabalharem em prol da melhoria desses indicadores. Mas quando nos referimos a qualidade do leite, principalmente a CCS a importância e o impacto desse indicador vão muito além da obrigatoriedade de cumprir os valores preconizados pela legislação, pois reflete a saúde do rebanho e a eficiência de diversos manejos adotados no sistema de produção. 

A legislação brasileira, determinada pela Instrução Normativa 76 (IN 76), determina que as propriedades devem apresentar resultado médio de CCS mensal inferior à 500 x 10³ células/ml de leite, valor esse que representa equilíbrio entre a saúde animal e segurança alimentar dos consumidores. Entretanto, sabe-se que na prática os produtores ainda enfrentam grandes desafios para alcançar esse objetivo.

Observando a figura 1 é possível identificar que apenas 11% das 550 propriedades analisadas pelo Departamento de Inteligência da Labor Rural obtiveram média da CCS anual menor do que 200 x10³ células/ml, valor referência utilizado para considerar um rebanho como saudável. E 54% dessas propriedades possuem média de CCS anual inferior a 400 x 10³ células/ml, valor ainda considerado aceitável para a sanidade do rebanho. Essas informações mostram que apesar da legislação já exigir valores de CCS menores do que 500 x 10³ células/ml, esse ainda é um desafio em grande parte das propriedades, e cabe a nós, profissionais e produtores da cadeia leiteira, trabalhar para controlar os valores de CCS das propriedades.

Figura 1: Porcentagem de propriedades que se enquadram em cada um dos estratos de CCS

Fonte: Departamento de Inteligência da Labor Rural. Resultados de 550 propriedades analisadas para o período de janeiro/2021 a dezembro/2021. 

Figura 2: Análise CSS UNIFORM-Agri

Fonte: UNIFORM-Agri

A CCS é um indicador muito trabalhado em nível de campo pois reflete o impacto dos manejos adotados na saúde dos animais, e é abordada pelas indústrias pois interfere diretamente no rendimento e qualidade dos produtos lácteos, gerando impacto no preço pago aos produtores e na aceitação dos produtos pelo mercado consumidor. Por isso, são implantados nos laticínios programas de bonificação pela qualidade do leite baseados nos valores médios da CCS mensal, conforme demonstrado na tabela 1.

As propriedades que apresentaram menor média de CCS anual conseguiram obter melhor bonificação no preço unitário do leite, o que contribuiu para que o preço médio dessas fazendas fosse 7,7% maior quando comparado ao preço recebido pelas propriedades que obtiveram pior média anual de CCS.

Além de gerar bonificação direta pelo seu próprio resultado, já é sabido que a CCS elevada é associada a alteração dos teores de gordura e proteína do leite (SANTOS, 2019), parâmetros também utilizados nos sistemas de bonificação do leite. Assim é possível observar que a bonificação das propriedades com menor média de CCS foi superior não apenas pela bonificação por CCS, mas também nos demais fatores considerados para a bonificação no preço pago pelo litro de leite, o que demonstra que essas propriedades tendem a ter melhores resultados de CPP (Contagem Padrão em Placas), gordura e proteína. Dessa forma devemos lembrar que o controle da CCS traz, também, benefícios financeiros para a propriedade.

Apesar do preço do leite ser um fator importante para a saúde financeira das propriedades, ele não é determinante para o sucesso

Tabela 1: Relação da CCS média anual com a bonificação e preço do leite

Fonte: Departamento de Inteligência da Labor Rural. Resultados de 550 propriedades analisadas para o período de janeiro/2021 a dezembro/2021. Informações econômicas corrigidas pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna) de dezembro/2021

da atividade leiteira. Para obter resultados financeiros positivos precisamos, acima de tudo, nos atentar e buscar equilíbrio do custo de produção.

Percebe-se, através da análise da tabela 2, que quanto piores os resultados de CCS das propriedades maiores são os desembolsos com medicamentos, o que é explicado pelo fato de quanto maiores os resultados de CCS maiores são as chances de ocorrência de mastite, e outras doenças associadas, o que desencadeia em elevados gastos com medicamentos.

Quando avaliamos o valor do custo com medicamentos por vaca (R$/vaca em lactação/ano) as propriedades com CCS média < 200 x 10³ células/ml apresentam maior desembolso, R$ 509,34/vaca/ano, do que as demais categorias, R$ 381,75/vaca/ano nas propriedades com CCS superior a 800 mil células/ml, mas esse valor é diluído quando levamos em consideração a produtividade dos animais nesses mesmos estratos. Isso acontece, pois, a CCS alta interfere diretamente na capacidade produtiva dos animais pois danifica as células produtoras de leite, fazendo os animais com resultados elevados de CCS tendam a menor produtividade de leite (litros/vaca em lactação/dia).

Tabela 2: Relação do custo de produção com os diferentes estratos de CCS

Fonte: Departamento de Inteligência da Labor Rural. Resultados de 550 propriedades analisadas para o período de janeiro/2021 a dezembro/2021. Informações econômicas corrigidas pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna) de dezembro/2021. *Custo com intramamário para vacas em lactação.

Em média, propriedades que apresentam CCS maior ou igual a 800 X 10³ células/ml podem ter a capacidade de produção das vacas reduzida em até 9,7%.

Em análise ao banco de dados da Labor Rural, percebe-se que caso as propriedades pertencentes ao estrato de CCS > 800 x 10³ células/ml melhorassem esse resultado para < 200 x 10³ células/ml seria possível obter:

  • Produtividade (litros/vaca em lactação/dia) de até 17,5 l/VL/dia;
  • Bonificação por CCS de, aproximadamente, R$0,06/litro;
  • Renda bruta de R$119.702,59/ano a mais do que a obtida com a CCS >800 x 10³ células/ml.

Todos esses pontos ocorreriam, pois, a redução da CCS leva a melhor produtividades das vacas, maior bonificação pela qualidade do leite e, consequentemente, maior renda bruta anual. Conforme exemplificado na tabela 3.

Tabela 3: Simulação dos indicadores após redução da CCS para <200 x 10³ células/ml.

Fonte: Departamento de Inteligência da Labor Rural. Simulação realizada a partir dos resultados de 550 propriedades analisadas para o período de janeiro/2021 a dezembro/2021. Informações econômicas corrigidas pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna) de dezembro/2021. *Custo com intramamário para vacas em lactação.

Figura 3: Ilustração do impacto obtido na produção mensal e renda bruta anual devido à redução da CCS, conforme apresentado na tabela 3:

Fonte: Departamento de Inteligência da Labor Rural. Simulação realizada a partir dos resultados de 550 propriedades analisadas para o período de janeiro/2021 a dezembro/2021. Informações econômicas corrigidas pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna) de dezembro/2021. *Custo com intramamário para vacas em lactação.

Conforme abordado anteriormente, a CCS gera impacto na bonificação do leite, na produtividade das vacas, nos custos com medicamentos e na renda bruta do leite. Mas será que realmente é viável investir na melhoria desse indicador? Para sabermos se uma atividade é economicamente viável precisamos avaliar dois indicadores:

  1. Margem líquida (ML): é a subtração da renda bruta (valores recebidos pela atividade) pelo Custo Operacional Total (COT – relação dos desembolsos diretos de valores somados à remuneração da mão de obra familiar e à depreciação). Demonstra a quantidade de dinheiro que “sobrou” para o produtor após ter custeado todas as despesas operacionais totais.
  2. Taxa de remuneração do capital com terra (TRCC): é a divisão da margem líquida da atividade pelo estoque de capital empatado em máquinas, benfeitorias, equipamentos, forrageiras não anuais e terra. Esse é o indicador que mostra a rentabilidade da atividade leiteira e permite comparar sua atratividade com qualquer outra atividade.

Figura 2: Gráfico demonstrando a Margem Líquida e a Taxa de Remuneração do Capital com Terra das propriedades agrupadas nos diferentes estratos de CCS

Fonte: Departamento de Inteligência da Labor Rural. Resultados de 550 propriedades analisadas para o período de janeiro/2021 a dezembro/2021. Informações econômicas corrigidas pelo IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna) de dezembro/2021. *Custo com intramamário para vacas em lactação

Analisando os dados do gráfico 2, nota-se que as propriedades com CCS elevada (superior à 800 X 10³ células/ml), obtiveram piores resultados de ML e TRCC do que as de menor CCS (200 x 10³ células/ml). Portanto o controle da CCS está diretamente relacionado com maior retorno econômico, contribuindo para que a atividade leiteira, nesse cenário, seja atrativa economicamente.

Apesar da CCS não ser o único fator determinante para que a propriedade tenha bons resultados técnicos e econômicos, podemos concluir que vale a pena investir no controle desse indicador, uma vez que está atrelado a melhoria de produtividade, margens e rentabilidade da atividade. 

Portanto, é nossa missão trabalharmos para melhorar a CCS das propriedades leiteira e colher os bons frutos gerados por essa mudança!

Autor:
Paolla Mara Dellabrida de Andrada Faria
Consultora Técnica da Labor Rural

Coautores:
Christiano Nascif
Diretor da Labor Rural e Superintendente do Senar Minas

Luisa Carla Cotta
Consultora Técnica da Labor Rural

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